domingo, 18 de julho de 2010

CORDEL DO NILDO CORDEL - FRANCISQUINHA

Sou poeta de cordel
Trago no sangue esta sina
Na arquitetura do verso
Minha mente não declina
Por isso vou construir
Mais uma obra com rima.

O que agora vou versar
É fato, não é mentira
Aconteceu a uma jovem
Da cidade de Cupira
Em solo pernambucano
No Sitio da Macambira.

Francisca moça pacata
De perfeita educação
De casa só se afastava
Para seguir procissão
Ir a enterro de parente
E em dia de eleição

Filha educada e zelosa
Em casa tudo fazia
Costurar, bordar, Cingir
Francisca tudo sabia
Era na cozinha a fada
Que todo homem queria

Sua fama de pureza
Corria toda cidade
Os moços todos sonhavam
Gozar de sua amizade
E prêmio maior seria
Desposar essa beldade.

Porém vê-la para muitos
Sorte grande já seria
Pois Francisca não ousava
Andar pela freguesia
Por segurança, em casa
Tinha tudo o que queria.

De segunda a sexta-feira,
Para educar a donzela
Uma freira contratada
Estava sempre com ela
Pois Francisca era uma jóia
Educada, santa e bela.

Por outro lado Raimundo
Um cidadão galhofeiro
Era a imagem do cão
Preguiçoso e bagunceiro
Que tinha passado uns tempos
Lá no Rio de Janeiro.

Com sotaque carioca
Puxando para o paulista
Raimundo lá em Cupira
Parecia um artista
Todas as moças da cidade
Figuravam em sua lista.

Um sujeito extrovertido
Bem quisto pela cidade
Amigo de todo mundo
Por sua sagacidade
Bonito, bom de conversa
Mas de pouca qualidade.

Todas as moças da cidade
Tinham a ele namorado
Mas nenhum pai gostaria
De ver Raimundo casado
Com sua filha e vivendo
Pra dentro do seu cercado..

Mas sabemos que o destino
Traça seu próprio caminho
E dessa forma juntou
Como galhos para um ninho
Raimundo e Francisquinha,
O "gato" e o "passarinho".

Um parente de Francisca
Naqueles dias morreu
Nesse velório a mocinha
Ao Raimundo conheceu
E seu doce coração
Por ele forte bateu.

Francisca não conhecia
A maldade desse mundo
E caiu fácil na lábia
De seu galante Raimundo
Que na arte do xaveco
Era um verdadeiro imundo.

Botou a mão na mão dela
Falando com muito estilo
Francisca ouviu passarinhos
Cantando junto com grilo
E Raimundo foi em frente
Colocando a mão naquilo.

Francisca endurecida
Fitava o namorado
Que pegando a mão dela
Com carinho e com cuidado
Foi pondo sem cerimônia
Em cima do seu cajado.

Francisca por puro instinto
Segurou o animal
Porém num susto em seguida
Tirou a mão do local
E perguntou: Raimundinho,
Pra quê guardas este pau?

Raimundo muito sacana
Com toda tranqüilidade
Disse: Francisca querida
Quanta ingenuidade
Isso aí é uma agulha
De costurar virgindade

Francisca examinou-a
E disse: Como é grossinha
E prosseguindo o exame
Encontrou uma fendinha
E perguntou ao Raimundo:
É aqui que põe a linha?

Seguiu dizendo: Raimundo
Gostei dessa novidade
Se essa agulha aí
Faz o que dizes de verdade
Levantas, vem e costura
Logo a minha virgindade.

Raimundo quis sair fora
Mas Francisca de pressinha
Fechou a porta da frente
Em seguida a da cozinha
E já retornou à sala
Sem vestido e sem calcinha.

Raimundo ficou sentado
Com o rosto empalidecido
E Francisca insistindo
Costura noivo querido
Pegando no instrumento
Sentiu ele amolecido.

Deu um salto para trás
Dizendo: pode ir embora
Porque homens mentirosos
Eu conheci muitos aí fora
Mas um frouxo e boxador
Fostes o primeiro agora.

Olhando para Raimundo
Disse dando uma risada:
Vou revelar-te uma coisa
Raimundo meu camarada
O padre que entra e sai
Aqui, sou eu disfarçada.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Para falar de cordel



A Literatura de Cordel é uma das mais antigas manifestações culturais do Brasil, e tem suas raízes fincadas nos pregões, que eram anúncios cantados no Portugal Medieval.




No Brasil, a literatura de cordel foi mais difundida no Nordeste e ganhou este nome devido à forma como era vendida. Os poetas populares criavam suas obras e como eram na sua grande maioria analfabetos, decoravam e em seguida faziam suas apresentações nas feiras e salões das cidades do interior do Nordeste. Muitas vezes a ordem era inversa, isto é, devido à grande capacidade de memorização destes artistas, durante uma apresentação, eles criavam uma nova história e ao mesmo tempo a decorava e passava a cantá-la, ou recitá-la por onde passava.


Alguns autores passaram a imprimir estas poesias e a vendê-las nas feiras e festas populares. Para chamar a atenção de público, eles expunham os livretos em cordéis presos a estacas, o que origem ao nome e para aguçar o interesse do publico cantavam ou recitavam partes do livreto, (folheto) e só retomavam a leitura após vender uma quantidade de livros por ele determinada.


Uma das características principais da Literatura de Cordel é a sua forma, que por sua história e importância para a nossa cultura não deve ser modificada ou deturpada. A base da literatura de cordel são versos de sextilhas, estrofes de seis linhas com versos de sete sílabas. O esquema básico de rima para o cordel e ABCBDB, onde o segundo verso rima com o quarto e com o sexto e os versos um, três e cinco são soltos. Outras formas de rima podem ser apresentadas como ABBAACCDDC, ou AAABCCCB, entre outras.


Exemplo I:






EU E VICENÇA – Autor desconhecido




A - Quando solteiro eu vivia
B - Era o maior aperreio
B - Alem de ser muito feio
A - As muié não me queria
A - Pra toda banda que eu ia
C - Com um camarada meu
C - Ele confiava n’eu
D - Ia beber e fumar
D - Fazer bagunça e brigar
C - E quem ia preso era eu...


Exemplo II:


VAQUEIRO ABADONADO – Não achei o autor


A - Fui um vaqueiro afamado
A - Mas estou velho e cansado
A - E minha luta de gado
B - Vou entregar ao patrão,
C - Sem fugir do evangelho
C - Na tristeza me emparelho
C - Por que um vaqueiro velho
B - Não tem mais disposição.


Qualquer outra forma de poesia, que fuja às regras acima e outras mais complexas, como o martelo, o quadrão, o galope,  como o que vemos abaixo, em respeito a esta arte, não pode ser chamada de cordel.
Sou homem e faço verso
Por que gosto de mulher
Também gosto de café
Outra paixão que confesso.


Para ilustrar este arte segue as belas estrofes inicias de obras primas do Cordel.


Do Cordel “A INTREGA DO CACHORRO COM O GATO”, autor José Pacheco, naturalidade imprecisa. Correntes PE ou Maceió – AL.


A intriga é mãe da raiva
O mau pensamento é pai
Da casa da má querência
O desmantelo não sai
Enquanto a intriga rende
A revolução não cai...


Do Cordel “A PRINCESA GENI E O REINO MONTE DE OURO” editor João José da Silva – Não consegui informação sobre o autor. Um acróstico no final do livro trás o nome Luiz de Lira, que pode ser o nome do autor.


Eis um mistério em poema
Exposto ao nosso cântico
Drama passado num reino
De um povo bem romântico
Que vivera muito além
Do Oceano Atlântico...


Do cordel “O HERÓI JOÃO DE CALAIS” de Severino Borges da Silva – Aliança–PE.


Vinde musas que habitam
As regiões divinais
E banham-se nas santas águas
Das fontes celestiais
Que vou versar o romance
Do herói João de Calais...


O cordel continua vivo e precisa de apoio e divulgação. Para você que gosta, uma dica é a livraria Cortez em São Paulo e a Editora Luzeiro. Busque na Net, você vai encontrar muita coisa boa. Tem também o site da ABLC, Academia Brasileira de Literatura de Cordel, que mantem viva esta bela tradição cultural.